O Blues de Santa Catarina ficou mais respeitado, com a atuação do músico gaúcho Cristiano Ferreira.
Desde que chegou aqui no estado, Cristiano vem tocando o seu repertório, acompanhando artistas do Blues nacional e internacional, e também tem desenvolvido um excelente trabalho como didata da guitarra, produtor de discos e de eventos e formando uma plateia cativa para o Blues. Esse seu empenho levou-o a um status de referencia como Guitarrista de Blues do estado de Santa Catarina, quer seja pela atuação, ou pelo conhecimento e/ou dedicação a este estilo, mas principalmente por ser um músico talentoso.
Para que conheçam um pouco mais desse artista, segue entrevista recente que fiz com o Cristiano:
Marco Cardozo - Cristiano, como foi o inicio do seus estudos musicais?
Iniciou no Violão, e influenciado por algum parente ou outro?
Cristiano Ferreira - Meu pai tocava violão eventualmente em casa. O violão ficava
muito tempo parado, encostado em um sofá, e um belo dia quis tentar tocar. Os
primeiros acordes aprendi em métodos que se vendiam em bancas de revistas.
Depois comecei a aprender com um amigo, e logo montamos a primeira banda, daí
não parei mais. A guitarra elétrica surgiu nessa época em que comecei a tocar
com minha primeira banda, pouco menos de um ano após me iniciar no violão.
MC - Essa sua paixão pela música étnica estadunidense, Blues,
Jazz, apareceu quando?
CF - Foi ainda no interior do Rio Grande do Sul, na minha cidade
natal Cachoeira do Sul. Com essa primeira banda ouvíamos e tirávamos de ouvido
muitas músicas do rock nacional da década de 90, principalmente das bandas
gaúchas. TNT era nossa banda favorita, e entre essas músicas tinham alguns blues que
eles tocavam. Tivemos a chance de vê-los ao vivo na festa nacional do arroz que
acontece todo ano na cidade, e a batida do rock básico, três acordes,
influenciado pelo blues nos pegou pra valer.
MC - Como você organiza os seus estudos semanais, estuda
técnica pura, repertório, e as composições autorais?
CF - Atualmente mais repertório. Teve uma fase quando era mais
jovem que devorava os discos. Depois passei a elaborar mais as questões
técnicas, foi quando voltei a estudar guitarra, aqui em Florianópolis, com o
guitarrista Cássio Moura. Fui aluno dele e do guitarrista Ozeias Rodrigues no
conservatório de música popular de Itajaí e, motivado com os estudos, ingressei
no curso de licenciatura da Udesc. Falo tudo isso porque, após praticamente uns
7 anos estudando música retomei meu vínculo com o repertório na minha prática
com o instrumento. Atualmente faço transcrições, com o intuito de tocá-las
realmente e de entender um pouco do estilo dos guitarristas que me
influenciaram.
MC - Quais são as suas principais influencias musicais e/ou
de guitarristas?
CF - Se tiver que resumir a um único seria BB King. Foi um dos
primeiros que ouvi e o que melhor sintetiza o que penso sobre o Blues, essa
aproximação do Blues com o Jazz. Mas tem outros que foram e ainda são importantes:
T-Bone Walker, Freddie King e Albert King são alguns deles. Dos contemporâneos
me identifico com aqueles que trazem a bagagem destes primeiros na forma de
tocar, como Anson Funderburgh, Guy King, Duke Robillard e Ronnie Earl.
MC - Você tem uma guitarra favorita, ou várias?
CF - Passei muitos anos tocando somente com uma guitarra, uma Fender Stratocaster feita no Brasil, uma das primeiras que saíram. Praticamente toda a
minha fase blues no RS foi feita com essa guitarra, gostava muito dela. Alguns
anos depois que cheguei a Florianópolis, comecei a estudar mais sobre
guitarras e amplificadores e aí passaram pelas minhas mãos vários instrumentos,
o que foi fundamental para saber o que funciona pra mim e para o estilo de
música que eu toco. Hoje eu utilizo muito uma Telecaster americana, reedição 1952
toda original, acredito que seja a guitarra que está comigo há mais tempo.
Também uso muito uma 335 dot da Gibson, um ótimo instrumento, perfeito quando
toco algo que vai além da fronteira do Blues. Mas sobre as guitarras acústicas
ou semi acústicas, confesso que ainda não cheguei no som que almejo no palco,
utilizando essas guitarras para Blues.
MC - No seu disco de estreia "Cristiano Ferreira e Trio
- Buzz me", você gravou com que set up?
CF - Utilizei um único amp, o Serrano Victory 40w, circuito
baseado no Fender Bassman Tweed. Foi um amp que definiu meu som depois que cheguei em
Florianópolis. Toquei com ele por uns 8 anos acredito. As guitarras foram três:
uma Epiphone Riviera com mini humbucker Gibson em uma faixa, uma Telecaster
japonesa reedição 1962 em outra faixa, e o restante das faixas com uma guitarra
montada nos estados unidos, com madeira da "Allparts" e captação nocaster,
basicamente uma Telecaster reedição anos 50.
MC - E o seu trabalho com a Big Band "Brass
Groove", que teve disco lançado neste ultimo ano, como aconteceu?
CF - Iniciou com um convite para fazer um show tributo à música
de New Orleans, um pouco de dixieland com funk. Na época o seriado Treme
passava em algum canal fechado, era um retrato do cenário musical em New
Orleans após a catástrofe que foi o furacão Katrina. Alguns da banda (o pessoal do sopro)
eram fãs do seriado, e estavam motivados para fazer aquele som com influencia
do Blues. Porém em seguida a banda partiu para um trabalho autoral, baseado em
música brasileira, mas eu acabei ficando. Tem sido um trabalho gratificante e
desafiador pra mim, tocar esse novo repertório onde as músicas são escritas, em
boa parte. É um contraste grande para alguém acostumado há um gênero onde é
preconizado o improviso.
MC - Conte-nos essa sua empreitada de montar o próprio
amplificador?
CF - Em paralelo a vida de músico procurei formação em uma área
que tivesse relação com áudio, assim me formei técnico em eletrônica, depois
Engenharia Elétrica e ainda encarei um mestrado em Engenharia Elétrica. Porém
nunca trabalhei profissionalmente na área do áudio, fui para outras áreas da
Engenharia Elétrica/Eletrônica. E ficou essa meta de algum dia desenvolver algo
na área do áudio. Ao longo dos anos fui tomando as rédeas da elétrica das
minhas guitarras, depois manutenção e modificações nos meus amplificadores até
que, após duas viagens aos Estados Unidos consegui trazer peças para montagem
de um Fender Deluxe Reverb. Por lá são vendidos kits com todos os componentes
necessários. Então fui montando aos poucos o amplificador, tendo ficado pronto
no primeiro semestre desse ano. Ainda carece de alguma atenção no circuito do
reverb, o funcionamento é intermitente. Acabei começando com um amplificador de
maior complexidade, comparado aos circuitos da era Tweed da Fender que possuem
menos componentes e não tem reverb. Os planos são de montar mais alguns,
inclusive outros modelos, assim que tiver um pouco mais de tempo para me
dedicar.
MC - Desse seu trabalho como professor de guitarra Blues, que
tem desenvolvido na escola de música Fábrica de Sons, em São José - SC, há possibilidade
de alguma publicação de material didático no futuro, visto que há uma lacuna na
produção científica no estado de SC?
CF - Até mesmo no Brasil há uma lacuna, já que os métodos abordam
o assunto de forma a ensinar alguns
licks e acordes, mas não algo mais
sistêmico, que possa auxiliar o músico a caminhar sozinho depois. É um desejo
sim, a medida que vou desenvolvendo material para as aulas já começo a delinear
um método “guitarra blues“ e, para um livro, não faltaria muito. Mas ainda
preciso de mais tempo. Tenho um projeto agora, um canal no
Youtube e blog,
chamado “Guitarra à moda antiga” (
https://ferreirablues.wordpress.com/). Enquanto isso, neste projeto, eu também vou soltando algumas ideias.
MC - Você está finalizando o segundo disco, em lançamento
previsto para o segundo semestre de 2017. Conte-nos sobre o repertório
escolhido e a produção do disco?
CF - Após o lançamento do primeiro, fiquei aproximadamente 3 anos
divulgando aquele trabalho, junto da banda que me acompanhava na época.
Encerrei aquela fase no "Mississippi Delta Blues Festival" de 2013, quando
acompanhamos o pianista Henry Gray. Queria retomar o vínculo com o Blues mais
tradicional, digo todo o blues feito até a década de 60, Jump, Chicago, Texas,
mas com aquela banda sentia que não conseguiria mergulhar mais profundamente
nestes estilos. No ano seguinte montei a nova com o Dayvk Martins (bateria) e
Danilo Brito (baixo), que já tocavam comigo na banda do gaitista Carlos May e o
Alexandre Green (piano). Naquele ano começamos então a produção do material que
entrou para esse disco. Fiz um apanhando de músicas antigas minhas, que ainda
não havia gravado e regravações de canções não tão óbvias de artistas que me
influenciaram, coisas do Muddy Waters, Roy Milton, T-Bone Walker, Big Joe
Turner e Duke Ellington. O disco nasceu no estúdio, não na estrada. Desde então
tenho tocado músicas deste álbum com a nova banda nos shows, mas somente com o
lançamento do disco que vamos formatar o show baseado realmente nessas músicas.
MC - Você acredita que seja importante a realização de
workshops sobre guitarra mais tradicional, e Blues, na região da grande Florianópolis,
visto que não há um publico formado para este estilo?
CF - Sem dúvida, e percebo que tem músicos interessadas, agora
que voltei a lecionar guitarra percebo isso. Mas ainda faltam mais
instrumentistas que dominem realmente a linguagem, para disseminar o
conhecimento de como se tocar um slide ou o jump blues, por exemplo. Felizmente
com a minha vivência de muitos anos tocando Blues já domino alguns estilos com
certa fluência, mas a gama de subgêneros e estilos dentro do blues é grande. O
Blues rural, por exemplo, ou blues do delta como alguns chamam, já é um
universo próprio, onde alguns violonistas/guitarristas usavam slide, outros
preferem o dedilhado inspirado no ragtime, outros utilizam afinação aberta e
ficam em um único acorde e exploram mais batidas com a mão direita, enfim, já
são várias coisas para serem estudadas somente dentro de um subgênero, do que
chamamos gênero Blues.
MC - Você pode dar alguma dica para músicos que desejam
tocar e /ou gravar um repertório Blues?
CF - É muito importante levar em paralelo tanto o estudo do
repertório, conhecer as músicas, compositores, álbuns importantes, como também
desenvolver uma sonoridade blues com o seu instrumento. O som do Blues vem, não
somente das escalas ou acordes, mas também de como você soa com o seu
instrumento e amplificador.
MC - PS. Meus agradecimentos ao Cristiano pela disposição em conceder-me essa entrevista.
Cristiano está terminando o seu segundo disco "Cristiano Ferreira - The Teacher's Rules!", e tem captado recurso de parceiros para a finalização dessa obra através de campanha até o dia 26 de Junho de 2017:
https://www.catarse.me/ferreirablues
Contato para Shows e Workshops:
ferreirablues@gmail.com